Estado de Minas caderno: Gerais
Contribuintes temem sofrer com a mudança do modelo de cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), a partir de 2010, e preparam o contra-ataque. Diretores da Associação dos Amigos do Bairro Belvedere (AABB) se reúnem hoje com integrantes de 25 entidades representativas de comunidades da Região Centro-Sul de Belo Horizonte para discutir ações contra a nova forma de reajuste do imposto apresentada, esta semana à Câmara, na forma de um projeto de lei, pela Prefeitura de Belo Horizonte.
Inconformado com a medida anunciada antes de qualquer consulta pública, o bioquímico Jeferson Rios Domingos, presidente da Câmara Comunitária do Conselho Nacional de Entidades (Conasem), que agrega 120 associações de bairros da capital, avisa que vai entrar com uma representação na Câmara e no Ministério Público para que o Executivo apresente justificativas para o novo modelo. O projeto de lei estabelece que o tributo não será mais corrigido pela inflação, mas de acordo com a valorização dos imóveis no mercado.
As lideranças comunitárias devem correr contra o tempo, pois a prefeitura trabalha para levar o projeto de lei a votação ainda este mês e aprová-lo antes do fim da atual legislatura. “Nenhum setor da população foi ouvido a respeito desse novo modelo. É uma forma arbitrária de anunciar que o valor do IPTU vai subir. Por isso, queremos que o poder público pelo menos justifique e nos apresente um programa com as obras que pretende fazer com esse aumento de receita”, afirma Jeferson Rios.
O representante do Conasen, que acumula a função de presidente da Associação Comunitária dos Moradores do Bairro de Lourdes (Amalu), reclama do valor do imposto que recolhe e da falta de investimento na região em que mora. “No Bairro de Lourdes, pagamos um IPTU alto, mas em contrapartida não temos uma prestação de serviços que justifique os valores. Precisamos conviver com buracos nas ruas e iluminação pública precária ”, diz.
Os representantes da Associação dos Amigos do Belvedere (AABB) pretendem pedir hoje ao vereador Fred Costa (PHS) que convoque uma audiência pública para discutir o novo modelo do IPTU. O diretor de segurança da AABB, o empresário Cláudio Manso, de 46 anos, pagou este ano, R$ 4 mil de imposto pelo seu apartamento, na Avenida Paulo Camilo Pena. Ele teme que o valor dobre em 2010. “Esse aumento anunciado é a herança deixada pelo governo Pimentel. O impacto dessa mudança deveria ser repassado à população de forma gradual, não imposta dessa maneira”, afirma.
Atualmente o valor do tributo é definido conforme o valor do terreno, a área e o padrão da construção. A correção, desde 2003, é pela inflação. No novo modelo, além desses quesitos, a localização terá peso fundamental no cálculo do imposto. Itens como o acesso a serviços e benfeitorias públicas também devem contar na avaliação do imóvel.
SEGURANÇA
Segundo Manso, a AABB é responsável por muitas melhorias no Belvedere, como os cuidados com a Praça da Coruja, conhecida como Lagoa Seca, a limpeza de ruas, manutenção das calçadas cobertas de pedras portuguesas e o serviço particular de segurança. “Temos sete funcionários que fazem a limpeza do bairro, compramos dois carros e duas motos para melhorar a segurança. Arcarmos com os custos de água, iluminação, capina e limpeza da Lagoa Seca. As 4 mil mudas que plantamos na praça foram compradas pela associação. O Belvedere é considerado um cartão-postal da cidade, mas são os moradores que sustentam esse título e na hora de cobrar, a prefeitura alega que as benfeitorias foram proporcionadas pelo poder público”, diz Cláudio.
Os moradores dos bairros beneficiados por corredores revitalizados, como a duplicação da Avenida Antônio Carlos e construção da Linha Verde, também temem o valor IPTU em 2010. O líder comunitário do Bairro União, na Região Nordeste, Euler José Alves, de 46, vive na área desde que nasceu e viu seu imóvel se valorizar com a criação da via que liga o Centro a Confins. Um avanço que pode custar caro ao seu bolso. “Quando construi minha casa, o bairro era uma fazenda. Hoje, meu imóvel poder ser avaliado em R$ 200 mil, mas não sei se consigo vendê-lo por esse preço. O desenvolvimento da capital acaba castigando a população”, queixa-se Euler José.
O presidente da Associação dos Amigos da Pampulha (Aapam), Flávio Marcus Ribeiro de Campo, tem uma atitude mais moderada em relação ao novo modelo e sugere esperar que a prefeitura apresente a conta e os motivos que justifiquem os valores cobrados no IPTU. “É mais justo que aqueles que vivem em situações melhores paguem mais, mas também as pessoas não podem ser punidas pela sua condição social. Vamos ver os aspectos técnicos e éticos que levaram a prefeitura a apresentar essa proposta.”
O diretor da Aapam, Carlos Augusto Moreira, também defende o diálogo. Ele cita locais do bairro que receberam melhorias, principalmente na iluminação, além dos benefícios com a duplicação da Antônio Carlos. “Não são só os moradores da Pampulha que desfrutam da duplicação da avenida e, por isso, é preciso ter cuidado com a avaliação que deve ser feita, levando em consideração a localização do imóvel. Vamos esperar para verificarmos como será feito o cálculo dos técnicos da PBH e assim analisarmos se a mudança foi realmente positiva”, informa Carlos Augusto.
Imposto muda a toque de caixaPrefeitura corre contra o tempo para aprovar ainda nesta administração alterações que devem onerar contribuinte. Um dos objetivos seria evitar desgaste para próxima gestão
O futuro do projeto de lei que reajusta o IPTU de Belo Horizonte pela planta de valores, a partir de 2010, está agora nas mãos de cinco vereadores, que integram a Comissão de Orçamento e Finanças da Câmara Municipal. Cabe a eles aprovar o texto, o que abre caminho para que seja levado ao plenário. É dado como certo que a decisão do grupo será favorável ao reajuste, pois a maioria integra a base aliada do governo. A apreciação estava prevista para hoje, mas, no fim da tarde de ontem, foi adiada.
Os titulares da comissão são Arnaldo Godoy (PT), Paulo Lamac (PT), Alberto Rodrigues (PV), Chambarelle (PRB) e Autair Gomes (PSC). O grupo ainda não definiu um relator para o projeto, figura que, até a sexta-feira da semana que vem, terá de entregar parecer com indicação de voto aos demais. Ontem, a informação era de que o presidente da comissão, Autair Gomes, apresentaria relatório hoje para que a votação ocorresse em reunião durante a tarde. Ele mesmo confirmou o fato para, em seguida, dizer que a apreciação ficará para depois. “Vamos discutir mais o assunto com a prefeitura”, justificou, depois de sair de reunião com o prefeito Fernando Pimentel (PT).
A partir da aprovação, a decisão tem que ser publicada e a inclusão do projeto em pauta, anunciada pela Mesa Diretora. Tudo isso pode ser feito num dia e, em dois dias úteis, o texto fica pronto para ser apreciado em primeiro turno. São necessários os votos de 28 dos 41 vereadores para que as regras passem e sejam levadas a apreciação em segundo turno. Depois disso, só resta a sanção Executivo para que virem lei.
A liderança de governo trabalha com a perspectiva de aprovação ainda este mês, uma jogada política que tiraria um imenso peso dos ombros do prefeito eleito Márcio Lacerda (PSB). Ele assumiria em janeiro, mas o ônus político do reajuste ficaria com a administração anterior. Já Pimentel sairia do cargo e, ao menos oficialmente, não teria mais que responder sobre as mudanças.
MUDANÇAS
Além de garantir maioria no plenário, a prefeitura pretende eliminar alguns obstáculos que podem atrasar a tramitação. O principal são as 10 emendas apresentadas pelos parlamentares. Se o texto passar em primeiro turno, é necessário que elas sejam apreciadas nas comissões antes da segunda votação, o que dificulta os planos do governo.
A base aliada tentará negociar para que as emendas sejam retiradas pelos autores. A maioria delas faz pequenas alterações no artigo que garante desconto no IPTU de entidades desportivas. Fontes do governo dizem que Lacerda é contra o benefício e pretende vetá-lo. Por esse motivo, pode haver resistência em retirar as emendas.
O projeto de lei foi encaminhado à Câmara menos de um mês depois das eleições municipais. Ele foi distribuído no dia 17 de novembro e, até hoje, nenhuma audiência pública sobre o assunto foi realizada. Para agilizar a tramitação, a Comissão de Legislação e Justiça convocou reunião extraordinária apenas para apreciar o texto.
Segundo o secretário municipal de Finanças, José Afonso Bicalho, o projeto foi enviado no fim da administração Pimentel porque, durante o período eleitoral, não havia condições de aprová-lo na Câmara, pois os vereadores estavam envolvidos em campanha. Ele explica que, se aprovado agora, a população terá um ano para discutir as mudanças, pois as regras só entram em vigor em 2010.
Na prática, o texto poderia ser aprovado até setembro do ano que vem, três meses antes de entrar em vigor. É que a legislação brasileira só autoriza a cobrança de imposto 90 dias depois de publicada a legislação que o instituiu. A prefeitura se nega a fazer simulações dos valores que passarão a ser cobrados em 2010. Parte dos vereadores afirma que outras informações fundamentais têm sido omitidas.
O projeto de lei divide a cidade em mais de 900 zonas homogêneas. Em cada uma delas, o valor do metro quadrado, que serve de referência para cálculo do tributo, será diferente. Só ontem, o mapa que indica como a cidade ficará dividida foi apresentado aos parlamentares. Foram criadas mais classificações para o padrão de qualidade dos imóveis. “Mas não nos informaram, até agora, quais foram os critérios para definir esses novos tipos de enquadramento”, reclama o vereador Fred Costa (PHS).
Ontem, ele apresentou requerimento pedindo à Mesa Diretora a suspensão do projeto até que as dúvidas sejam esclarecidas. E também convocou reunião especial com representantes da sociedade civil, marcada para quinta-feira. “Estou indignado, não só com o mérito da proposta, mas a forma como vem sendo conduzida na Câmara. Nós, que vamos votá-la, não temos informações básicas para mensurar o impacto no bolso do contribuinte”, afirma.
Alerta para distorções na forma de cobrança
O economista Eduardo Coutinho, professor de Finanças da Faculdade Ibmec, avalia que o projeto apresentado pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) para mudanças no IPTU é uma tentativa de se aproveitar do aquecimento do mercado imobiliário para aumentar a arrecadação. Ele explica que os preços dos imóveis foram apurados em 2007, durante o boom no setor, e não necessariamente os valores vão se manter nos próximos anos, principalmente por que o cenário previsto é de crise econômica. O risco é de que o cidadão pague tributo pesquisado na alta, referente a imóvel que se desvalorizou.
O especialista avisa que o resultado mais previsível do texto, se aprovado, é um impacto maior no bolso do contribuinte, principalmente o das classes média e alta. É que a renda da população tem crescido menos do que a valorização dos imóveis no mercado, critério que será usado para definir o aumento. A prefeitura alega que o próprio aquecimento do setor é prova de que o cidadão vem ganhando mais. Mas o economista esclarece que a expansão da demanda por imóveis está mais vinculada às facilidades de crédito, com juros mais baixos e prazos de pagamento dilatados. Em outras palavras, para comprar casas, lojas e apartamentos, as pessoas se endividam.
Ele também critica a regra de transição anunciada para amenizar os impactos. De acordo com a Secretaria Municipal de Finanças, o aumento será escalonado: um terço em 2010, dois terços em 2011 e o total a partir de 2012. A regra não consta do projeto de lei e, afirma o secretário de Finanças, José Afonso Bicalho, será incluída em regulamento do prefeito. “Uma portaria pode ser revogada a qualquer momento. Se eles criaram a norma, ela deve estar na lei, como garantia”, comenta o professor.
quinta-feira, 4 de dezembro de 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário